Ativando o poder da liderança distribuída

Fábio Cunha
5 min readAug 9, 2019

Nas estruturas hierárquicas pirâmidais existentes nas empresas tradicionais, a liderança está concentrada no topo. Somente aqueles nas posições superiores são responsáveis por tomar decisões, e o acesso às informações também está restrito a estas pessoas.
Nesta estrutura existe uma escada bem definida que as pessoas devem subir para que possam exercer papéis liderança, que quase sempre está atrelada a um cargo e associada a ter poder e autoridade sobre outras pessoas.

Este modelo funcionou e trouxe resultados por muito tempo, porém pode não ser a melhor escolha no período atual, onde mudanças em todos os setores ocorrem em uma velocidade que nunca experimentamos em nossa história.
O mundo é Volátil, Incerto, Complexo e Ambíguo, toda informção que a humanidade já produziu dobra a cada ano e isto em um mundo conectado traz infinitas possibilidades, onde as decisões precisam ser tomadas com muita agilidade, a sobrevivência das organizações no futuro está relacionada com a sua capacidade de se adaptar rapidamente às mudanças.

As pessoas estão adoecendo cada vez mais por causa do trabalho, em um mundo com infinitas possibilidades não faz sentido estar em um trabalho desagradável, 8 horas por dia, 40 anos de uma vida, e quando não há mais sentido, o corpo e a alma adoecem.
As jovens gerações que já nasceram no mundo digital (após 1990) tem ainda maior dificuldade em se encaixar neste modelo pois desde cedo estão habituadas a ter acesso as informações, fazerem escolhas e se comunicar usando os melhores recursos de tecnologia disponíveis.

O trabalho do futuro não é algo desagradável que devemos fazer para sobreviver, mas sim uma forma de colocar nosso propóstito em movimento, onde sim podemos ser felizes e plenos. Isto não quer dizer que cada um só vai fazer tarefas que gostam, mas que temos poder de decidir “como fazer”, que não precisamos de um chefe, mas aprender a trabalhar em conjunto, colaborando um com os outros para as entregas necessárias.
O caminho para isso é ter autonomia para tomar decisões relevantes, decidir como, quando e onde é a melhor forma de realizar o seu trabalho.

A liderança distribuída ou autogestão é uma abordagem para a orgnização do trabalho que distribui o poder, prioriza a autonomia e o autodesenvolvimento enquanto trata de forma eficiente o alinhamento com outros times e com os objetivos da organização.
Atualmente muitos empreendedores estão atuando em uma nova estrutura de trabalho que nasce a partir das infinitas possibilidades de um mundo conectado e digital que é a estrutura em redes distribuída.
Em uma rede não há hierarquia, as informações fluem de forma transparente entre todos os nós e as decisões são tomadas por aqueles que sentem a necessidade e serão impactados.
Esta estrutura permite que as pessoas construam novos negócios conectados por um propósito em comum. Esta estrutura traz fluidez, adaptabilidade e agilidade que empresas formais não poderiam atender.

Trabalhar em uma empresa ou empreender em rede também traz inúmeros desafios, pois nós não aprendemos a trabalhar assim.
Desde a escola estamos habituados a ter uma autoridade formal ditando as regras e temos dificuldade em trabalhar de forma totalmente colaborativa, co-criando acordos e tomando decisões em conjunto de forma eficiente.
Se o papel do gerente tradicional não existe mais nas novas estruturas, o gerenciamento do trabalho é extremamente importante e ao invés de estar concentrado na mão de algumas pessoas, é exercido de forma distribuída.

No livro Better Working Together, Allana Irving ( https://www.alanna.space/) nos apresenta 5 etapas para sair de um modelo de comando e controle e cultivar a autogestão:

1O Solo — Poder Distribuído
A primeira etapa prepara o campo para que o poder seja distribuído.
A autogestão e a colaboração efetiva não acontecem por decreto. Não se pode simplesmente declarar “não há mais chefes” e esperar que todos se auto-organizem. Hierarquias ocultas vão aparecer e a autogestão vai morrer antes de nascer.
O poder que uma pessoa exerce sobre os outros não vem apenas de uma posição de autoridade como um cargo. Ele surge de diversas fontes, como experiência, tempo de empresa, idade, estilo de comunicação e personalidade. Algumas pessoas tem a tendência de se impor sobre as outras, enquanto outras tem o hábito arraigado de receber ordens e enfrentam dificuldade em um primeiro momento em lidar com a autonomia.
Aqueles que detém o poder mesmo sem uma estrutura hierárquica explicita
tem a responsabilidade de proativamente abrir mão e distribuir o poder.
As dinâmicas de poder entre pessoas sempre vão existir, por isso devem existir mecanismos definidos para a inclusão de todos e tomada de decisões.
O importante é que existam acordos claros de como o poder será distribuído, para que todos tenham voz.

2A Semente — Auto-Liderança
Na segunda etapa as pessoas começam a experimentar a autonomia.
Uma relação entre adultos assume que as pessoas são capazes de cuidarem de si. Desde a formação escolar a maioria das pessoas está presa em uma cadeia de comando e controle onde devem seguir ordens de alguma autoridade.
A autorresponsabilidade é a chave nesta etapa. Cada um precisa ser responsável por suas escolhas e por seu próprio desenvolvimento. O autoconhecimento é parte essencial deste processo.
As pessoas se tornam capazes de se comunicar de forma clara, executar seu trabalho de forma independente e pedir aconselhamento e ajuda quando necessário. Elas se adaptam e colaboram pois conseguem alinhar suas motivações com os compromissos da organização.
A liderança distribuída começa com as pessoas liderando a si mesmas.

3Germinando — Liderando outros
Na terceira etapa, novas formas de liderança surgem
A liderança pode ser exercida sem exercer autoridade sobre as pessoas.
O novo lider é um mentor, ajuda as pessoas a remover obstáculos e facilita processos. O lider inspira uma visão de futuro e visão sistêmica.
A liderança é alternada entre as pessoas por projetos e iniciativas e não está necessariamente relacionada a um cargo. O lider atua como facilitador dos grupos, ajudando as pessoas a delegar, comunicar e colaborar.
Coordenar sem hiearquia é a arte da facilitação

4Florescimento — A Liderança é distribuída
A experiência que começa com times isolados, se espalha pela organização.
O nível das decisões que as pessoas podem tomar de forma autônoma aumenta. Aqui são criadas mais oportunidades para que as pessoas exerçam suas habilidades de liderança.
Nessa etapa os gerentes aprendem a confiar e não se envolver nas decisões dos times, mesmo quando acham que poderiam fazer melhor ou mais rápido, eles apoiam o desenvolvimento das pessoas e estas sentem-se seguras.
O sucesso está no amadurecimento e distribuição da liderança até que o papel de gerente se torne obsoleto.

5Polinização — Cultivando o Ecossistema
A organização ou rede já trabalha de forma autogerida, e sente que a prática pode ser compartilhada com todo o ecossistema, formando uma rede de redes. As perguntas que regem esta estapa são:
Como podemos criar catalisadores que geram novas comunidades colaborativas?
Como podemos apoiar a colaboração de rede para rede?
Como podemos reestruturar nossas comunidades para que todos possam liderar?
Como podemos mudar a distribuição do poder na sociedade?
Como podemos dar mais acesso e compartilhar informações?
Como coordenar a ação coletiva?
Os líderes do ecossistema pensam no impacto que podem causar na comunidade além da sua própria organização.

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Fábio Cunha

Explorador do novo mundo das organizações. Especialista em soluções de comunicação e colaboração. Facilitador de práticas de autogestão.